Vagueios indiscretos não guardados em mim

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Parecia nova na cidade, é isto que sentem as pessoas que perdem a memória? Olhava a volta. O fumo que saia dos pequenos carrinhos que são dedicados a assar castanhas, o barulhos das actuações que iam aparecendo de cada grupo de pessoas que tentava fazer algum dinheiro para talvez passar um bom Natal, os vendedores ao longo das ruas estreitas que logo se tornam em avenidas gigantes e super movimentadas da impossível capital nesta altura... O som das pessoas que lutam pelo mais barato, o som de quem apenas passeia em alturas destas, como sendo a sua maneira de mostrar a sua tolice ou de repetir o seu dia a dia sem tirar folga deste mesmo quando quase é impossível mexermo-nos ali. É como a melodia do mar numa praia vazia, numa noite escura e sem luzes dos candeeiros, com maré vaza. Nada podes mudar, montes de mundos juntos: nenhum a manifestar-se na verdadeira essência do manifesto, da libertação da expressão do ser. Nada. Vazio. Todos procuram o mesmo: presentes sem valor; tanto sentimental como real. Barato, engraçado. Presentes sem história, sem utilidade, apenas com a sua futilidade. Porém, eu continuava a andar, meia perdida, pelo meio, sem saber quantas ou quais ruas tinha de atravessar, perdida pelo que acabara de deixar. Custa muito. Estamos habituados a algo. De repente muda e é incrível como numas horas, levados pelo desejo daquilo se tornar rotina, a nossa ideia de dia a dia muda. O desejo é realmente uma coisa incrível. Continuava eu, ainda perdida, sem pressa pra nada ao contrario de todos os outros que corriam com um caminho traçado, com um objectivo definido... Já nao sabia quem era ali. Se era uma alienada do ambiente, se fazia parte daquilo já que ninguém em mim reparava... No entanto , o ar estava leve, frio, e apesar da constipação, sentia-me bem. Apesar do cansaço da doença, estava bem. Sim, sou feliz e nao tenho medo do futuro. Venha o próximo ano, a seguir a este Natal materialista que tenho visto ser preparado em ocasiões como esta.
(a cidade do Porto é realmente uma cidade linda e pra mim , vai sempre ser a real capital deste miserável país)
Um óptimo Natal e um excelente ano novo

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

gritar, falhar-me a voz, queixar-me de tudo finalmente. sem medo de magoar. sem receio de me errar. sem olhos alheios a absorverem tudo o que acontece. com um lado compreensivo, mas sem um abraço no fim. gritar com lágrimas cheias de razão. soltar palavras que passam cada uma meticulosamente no meu cérebro, numa dança de reações infinitamente verdadeiras, e sem medo de se mostrarem. queria poder berrar, chorar, chatear-me com tudo, sem medir o tom de voz ou a intensidade das palavras, queria sentir-me livre... queria mandar tudo dar uma volta e sair daqui pra fora. queria poder esperar que viessem ter comigo.
mas ninguém vem, e a vida, essa é que não espera mesmo.

domingo, 30 de outubro de 2011

domingos de inverno

ai o domingo. o dia em que todo o tempo do mundo está connosco e deixa de estar. o dia em que o tempo vem almoçar a nossa casa, com a maior das calmas, em que o almoço é mais preparado, quando se liga o forno, quando se come na sala, quando o som dos filmes da televisão está ligado num tom baixinho que não deixa perceber o que está a acontecer e nos obriga a ficar o resto da tarde a olhar para as legendas, sentados e deitados ao mesmo tempo ali no cantinho do sofá, possivelmente, até com os livros e os cadernos que tanto tínhamos que estudar em cima de nós, ou até mesmo, ao nosso lado, vendo connosco as cenas variadas dos filmes variadíssimos que vamos saltando de canal em canal, de preferência, entre os enormes intervalos de cada um dos primeiros quatro canais da televisão portuguesa. o dia em que temos tudo para fazer e de repente olhamos pela janela e é de noite, noite já cerrada, num fim de tarde que veio cedo demais para sequer nos dar tempo de cumprir todas as tarefas a que nos propusemos. "oh, se ao menos tivesse mais um dia"

domingo, 16 de outubro de 2011

E estava assim parado o homem, parado no tempo como quem nao se importa com o que o futuro para ali reserva, com olhar no infinito, uma das mãos no bolso e a outra levando o cigarro à boca. um cigarro obviamente oferecido, este homem nao tem dinheiro. Nao tem dinheiro nem pra cigarros, nem pra novas roupas, pra desfazer a barba ou sequer comer. Há uns dez minutos estava a pedir-me dinheiro. Se soubesse tinha lhe oferecido um cigarro dos meus, se saciava a espera por algo melhor, teria sido um bom gesto. Pergunto-me muitas vezes porque é que as pessoas tem o vicio de olhar para algo que nem existe, de (des)focar uma imagem e olhar para o que nao conseguem ver durante muito e muito tempo. Melhor que esse vicio, temos o facto de ele estar ali a espera de algo. Ou entao a espera de nada, sim, porque aquele homem parece tentar fazer acontecer muitas vezes. este podia bem ser um momento em que nada esperava, como que tirando uma pausa da espera do futuro que procura.
Nao sei o que é do meu, mas sei que já estive e já quis ficar assim demasiadas vezes, por isso agora vou a procura de outra coisa. Um presente.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

reparei que os teus olhos ainda se prendem nos meus. reparei que choro de cada vez que ouço a primavera. entristeço no pensamento das tardes com as àrvores e o sol que transparecia por entre as folhas. é estranho como o facto de alguém desaparecer da minha vida se deu raramente. ou melhor dizendo, nunca se deu. nunca. mas tu ficas marcado numa outra presença, uma outra força, outra vontade que ultrapassa todo o desespero que conheceste em mim por outra pessoa. é um desespero triste, cheio de saudades, que ri e sorri quando percebemos os dois que há algo pendente por aqui. não sei porquê. a vontade de deixar o meu olhar cruzado com o teu devia ser infinita. e é. mas deixa-se interromper pelo riso que não sei de onde sai. e o teu ar de incomodado que pelos vistos sai da falsa superioridade que aparentas quando me tento a falar contigo. imagino o contacto contigo como forma de consolo ao pensamento de melancolia que abraça a saudade. que abraça a saudade como eu própria te queria abraçar e ouvir mais uma vez palavras de consolo ao dia péssimo, à condição horrível ou simplesmente à tua falta. queria chorar e magoar-me ao ponto de querer bater-te. porque nao iimporta o quanto uma pessoa nos magoa, se a amamos, deixá-la ia custar-nos muito mais. deixar-te foi horrível. perder-te ultrapassou todos os extremos limites de algo que não reconheci de início. sei que tudo o que dissemos foram meias verdades e lamento por isso. lamento que tenhamos chegado ao ponto de em situações pontuais termos de dizer que nos odiamos e mostrar isso.
lamento ter de chorar à frente do teu sorriso morto que todos pensam estar a respirar bem.
lamento que o facto de olhar pra ti te faça quase como obrigar-te a devolver-me o olhar perturbado de quem tem demais pra dizer.
tenho muito pra te transmitir, tenho mesmo muito. mas as palavras correm e levam-me o chão atrás, por isso fico-me por isto: tenho saudades tuas, como é que estás? (agora diz-me o mesmo, mas sem mentir)

terça-feira, 6 de setembro de 2011

erica.

erica acordou. era já a sexta vez que acordava de noite. tinha muito pra dizer. suava e chorava e ria, e sorria, e olhava o infinito e as estrelas na sua imensidão. imaginava-se por lá com uma vontade de estar por cá, com coisas pra dizer aqui, mas com desejos de apenas conhecer o que se passava ali longe e desaparecer. queria berrar e estar calada. queria dizer tudo e não sabia que tudo queria nomear. queria o mundo e não queria nada. doía-lhe a cabeça, os membros, a barriga. tinha vómitos do quanto chorava, sentia até na pele o latejar do coração, tinha um nó no cérebro para além de o ter na garganta e no coração. tinha energia pra tudo mas caía fraca no chão sempre que tentava chamar por ele. sentia uma força de ódio enorme antes de sentir a tristeza que nela vivia. a confusão na sua cabeça tomou conta de tudo. não comia o pouco que lhe traziam, não conseguia sentir os cheiros, nada reconhecia, só chorava e fingia chorar quando já não havia mais lágrimas para caírem. a boca estava isenta de qualquer movimento. estava seca, e devido à dor de cabeça que a acompanhava, não respirava pelo nariz duma forma estranhamente estranha. estava magra, que nem vielas, e fria... muito fria. e a arder por dentro. não queria morrer, queria estar bem e em condições para tudo, mas não estava. por isso, a morte era a sua primeira opção. presa lá outra vez, desta podia gritar e sussurrar sem medo, ter todas as epifanias que precisasse, a sua mente louca já era desculpada naquele meio. mas o sentir-se incapaz ainda a deixava pior do que o antigo silêncio forçado. mas a incapacidade só a deixava mais lúcida. mas a lucidez não lhe dava respostas. e ela não sabia viver nela, nunca soubera. nunca fora lúcida. as pessoas lúcidas têm sentimentos profundos por várias vezes na vida. ela não tinha. e quando teve, tornou-se lúcida, real, deste mundo. e o desejo de partir para a loucura do mundo dela tomava-lhe conta da alma. daí os olhos vazios postos no céu. quando se apercebeu que nunca conseguiria sair dali chorou, de boca aberta, num certo e horrível desespero, olhava o chão, andava louca em voltas no pequeno espaço que sempre lhe fora ali cedido. sentia as lágrimas escorrerem, mas nem as sentia saírem dos seus olhos. sentia-se incapaz de tudo. e por isso chorava. a cabeça confusa, a mente vulnerável a qualquer saída.
revoltada, virava tudo num abrir e fechar de olhos, berrava agora. e sentia-se fraca. e continuava cheia de força. e queria voltar atrás mas não o desejava. queria ardentemente ficar bem, mas tencionava querer ficar no desespero em que se encontrava por ser algo que agora conhecia.
chorou. a vontade de chorar permanecia. as dores acalmaram e reduziram-se a um tal cansaço e a um batimento cardíado bem definido na sua cabeça, um latejar inconfundível, que ela sentia como nunca antes tinha sentido. estava deitada no chão, ela quente, o chão gelado.
levantou-se ao fim de algum tempo, agarrou no pouco que trazia consigo. escondeu-se atrás de uma mulher forte, a parecer uma criança sossegada, uma jovem de causas e convicções, dona da sua razão e de um certo amor, secretamente fugido. no rosto abriga marcas, más e feias rasteiras da vida. interiormente, leva a luta. a luta nem sempre fácil guardada na alma de quem se sente agora completamente sozinha. essa dura alma, que transporta também o peso de quem cedeu por uma única vez, devido ao amor que ninguém conhece estar agora longe e quase desaparecido. mas também o peso maior de quem voltou atrás e agarrou na sua razão e foi a última a bater o pé. vai por isso pesada, com um segredo que o outro vai espalhar, difamar e vender. um segredo que a vai fazer parecer barata, vendida e triste na solidão. e erica mais uma vez vai ficar mal amada no seu meio. e vai ter de voltar ao sítio onde desespera. e vai ter de fazer parte destas linhas de palavras que se reúnem a contar a história de quem vive longe demais. noutro mundo. de outra maneira. e ainda não se encontrou por ser inconstante perante as constantes situações da vida e permanece igual enquanto a vida mostra o seu lado rebelde e muda diariamente.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

nenhum sítio é realmente nosso até termos a certeza que ninguém nos ouve ali. e esses sítios são, geralmente, inexistentes.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

as palavras saíam-lhe da boca e os meus ouvidos recebiam-nas como lembrança do passado. o medo nascia na minha cabeça e nem o ambiente calmo do quarto me deixava menos melancólica. fechei-me ao que dizia a pensar porque associara o que ouvia a sentimentos do passado, por mim arrumados até ao último milímetro. foi quando a sua voz amaciou e as palavras adocicaram. de repente já não era a luz confortável do quarto ou os lençõis e as paredes brancas. de repente era o ar mais amarelo, o perfume a mel, os brancos edredons da cama que reflectiam o torrado doce da luz que enchia o quarto! era o conforto do outro lado dos sentimentos, e a voz dela que ia ficando mais baixinha e as palavras que se iam moldando nos meus ouvidos. a almofada ficou mais mole, mais afável, e o cansaço das pernas ficou mais leve e tornou-se num certo conforto que me fazia querer ficar no meio dos lençóis a ouvir a história onde reconhecia agora o meu presente.
sabes o que dizia? bocadinhos do que sinto, bocadinhos e pepitas de encontros desejados. bocadinhos de mel que lhe saíam da boca como que dizendo que sabe o que é estar apaixonada. na tão singular maneira dela. e eu entendendo na minha tão simplória forma de amar. querendo mais, ouvi, e a essas palavras, a reacção foi diferente. fechei-me ao resto, não me lembro de mais ter reparado no quão brancos os lençóis eram, mas lembro-me de pensar nuns olhos, num rosto, e nuns lábios.  pensei no que sentia, no tal aperto que sinto, na vontade de  um abraço. ela falara-me do quão diferente era, quase me chamando banal, eu não queria saber, se era igual a tudo ou a todos, era o que sentia, e ela voltava deitando-me ao chão porque com ela era diferente. mas quando se aprofundou bem no pensamento, viu como eu, e falou mais doce, mais suave e tocou música para os meus ouvidos. foi quando percebi que todos amamos diferente. mas sentimos igual.
acordei, abri os olhos mas logo os fechei. o dia já tinha aberto há muito aqui onde o sol se levanta bem perto. os lençóis reflectiam bem a tinta branca das paredes. acho que é o bom dos quartos brancos. reflectem tudo o que há de bom na luz que é espalhada. reflectem o optimismo. e é muito do que preciso. ainda hoje me disseram de uma forma estranhamente amorosa que era dramática. talvez em parte pela maneira como escrevo. ou se calhar até é só porque preciso que isto se torne tudo menos real, que seja tudo pior, tal como nos filmes que vejo. tal como nas histórias que conto. dramática ou não, realmente preferia acordar sempre num quarto de lençóis e paredes brancas, com luz igualmente clara a bater-me na cara mal abrisse os olhos. como ter o meu dia salvo por uma espécie de folha branca em que pintava o que queria. como os problemas fossem os problemas de hoje, não os de ontem ou os de amanhã. como se o que fica do que se passou há tempos não tivesse que ficar guardado de certa forma aqui dentro, apesar de todas as lições que me vão ensinando todos os pequeninos erros e todas as suas enormes consequências.
continuando a minha estranha e feliz forma de acordar, senti que havia uma vontade enorme de sorrir. e melhor, de respirar. lembrei-me que já tinha acordado uma vez. oito horas da manhã e o telemóvel despertou. a nossa vontade de acordar cedo para aproveitar cada raio de sol havia sido enorme no dia anterior. já o cansaço das poucas horas dormidas devido à conversa contínua da noite anterior prendeu-nos a todas à cama e àqueles lençóis brancos que emanavam uma tamanha calma que absorvia o dramatismo todo. tinha dormido bem, relaxada. o dia manteve-se calmo, e depois de me falarem do dramatismo da minha escrita, inconscientemente ou menos inconscientemente, os problemas(sinhos) do dia anterior, à tarde pareceram muito pouco. tão pouco que parecia que me queria irritar violentamente (ou só irritar um bocadinho) e não conseguia. se calhar estava relaxada pelos tais lençóis calmos e claros e pelo sol radiante que se manteve ali o dia todo.

domingo, 19 de junho de 2011

auto-retrato.

-Toma, aqui. - e apontei para o papel branco que acabara de pousar em cima da mesa- o teu retrato, como quiseres.
-Não sei desenhar.
-Escreve, então.
A rapariga pegou no lápis, no mais leve de todos, e escreveu, desenhou, sarrabiscou, virou o papel ao contrário, continuou. Olhei, estava tudo apenas cinzento, um cinzento claro. Para mim, estava tudo com um nevoeiro que apagava toda a cor já desenhada por ela atrás daquilo. Pegou no mais escuro, começou a escrever. Escreveu, escrevia, deixava espaços que depois preenchia, tudo a negro.
A sua expressão ia sendo dura, rígida, de repente ficava triste, cansada. a testa franzia, a boca descaía, piscava lentamente os olhos, sorriu e começou a chorar. a folha acabou, e o lápis partiu.
Rasguei a folha quando acabou.
-Desenha o que queres ser.
-Já disse que não sei desenhar.
-Sabes que não é por mim, é por ti.
Nova folha, limpa, vazia. Entregou-ma tal e qual.
-OK, é isto que queres ser?
-É. Nada. É mesmo isso. Um vazio.
Contei. Uma, duas, três, quatro, cinco, seis. Sete palavras que tinha acabado de dizer. Falava muito, como nunca tinha falado, dizendo algo sobre tão pouco, que quisesse dizer tanto.
-Pronto, se não queres ser nada, podes reduzir-te a uma insignificância só tua, desaparecer, ficar cada vez mais apagada. Tens pessoas que gostam de ti, achas que consegues apagar-te?
-No mundo há sempre alguém que gosta de nós. E apesar disso, não há tanta gente assim?
-Há, e tu queres ser igual aos outros?
Pegou no papel e desenhou uma linha recta.
-Quero ser assim, não igual a todos, mas igual a tantos outros. Plenitude. É isso. Preciso de ir, adeus.
E saiu, como se não me tivesse dito nada ainda, como se fosse apenas uma conversa rápida, simples, daquelas que todos temos em cinco minutos das nossas vidas.
Fiquei no meu sitio, apanhei os papéis rasgados. Li uma e outra linha. Chorei. Chorei até não poder mais. Doía-me tudo de o fazer, tremia, chorava, chorava mais. Sentia as lágrimas caírem-me da cara, saírem dos olhos, escorrerem pela cara, caírem pelo pescoço e secarem, uma e outra vez. Comia e chorava. Ainda mais. Sentei-me na janela, e olhei para o céu, chorei mais e mais, e mais, até achar que era impossível chorar mais. Não era. Passado um tempo, chorava de novo, doía-me a barriga, doía-me o corpo, a garganta, doía-me a alma porque já nada mais havia pra chorar. Mas continuavam a vir soluços, com lágrimas misturadas, uma dor no peito que aparecia e desaparecia, e uma vontade de chorar ainda mais sufocada, soluçando alto e bom som como me apetecia. Como é que estava? Vazia. Estava tal e qual uma folha branca. Mas a minha vida estava um caos, com um nevoeiro claro por cima das histórias felizes que passaram, com apontamentos a escuro de tudo o que me confundia e pesava em mim. E pior de tudo? Estava rasgada. Olhei para o mar, a linha do horizonte, onde não há ondas, nem parece chover, onde tudo é tranquilo. Uma linha recta no meio de uma folha. Era onde queria chegar.
Peguei no telefone e liguei, ninguém me atendeu. Havia algo que não ia resolver-se naquela noite. Fiquei a falar sozinha, praticamente, fui pensando em tudo. No fim, desliguei-me, fechei a janela. Fui dormir, descansar a alma que tanto tinha andado adormecida e que de repente acordara tão revoltada e atravessado uma tempestade tão violenta.
No dia seguinte estava tudo bem, tinha-me esquecido da chamada perdida, a rapariga não voltara, mas havia tido uma visita à hora de almoço. Uma mensagem, pouco preocupada, provavelmente a perguntar o que se passava por mera rotina. A curta conversa foi então interrompida pelo almoço a duas, e esse almoço foi subitamente interrompido por uma visita que alinhou tudo numa só linha, uma visita que me encheu o peito de novo, encheu-me de esperança e de motivos para não chorar. Foi-se embora e sorri o resto da tarde.
(...) Ia lá eu adivinhar que a rapariga me ia visitando de quando em quando, uns dias depois, várias vezes por semana, desaparecendo e aparecendo quando bem lhe apetece. A única diferença, é que agora sei que há alguém que me aparece quando combinado, que me deixa tranquila, quando a tempestade bate na porta.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

arrependo-me de montes de coisas na minha vida: o facto de me faltar juízo nas piores situações, as faltas de responsabilidade constantes, a ausência de actos corajosos, a procura dos gestos falsos só pra adiar o sofrimento. e no entanto, há outras das quais me orgulho, e tenho milhões de certezas. tenho tudo delineado. até uma certa altura.
por vezes arrependemo-nos de certos actos, que trazem consequências mas boas. tu, porém, foste uma dessas consequências. em pouco tempo, tornaste-te uma certeza dum acto, tornaste-te em algo que sinto que posso, que quero, e tenho. de certo modo. há outras coisas que falham, mas sobre isso, prefiro adiar falar, como sempre fiz.

sábado, 26 de março de 2011

«mas jurar parece um gesto em vão»
e é. podia jurar-te amor eterno. melhor. podia jurá-lo a mim mesma. mas não o vou fazer. vou esperar que seja a eternidade a fazer isso por nós.
mergulhei, e mantive-me submersa até que a falta de oxigénio retirasse de mim toda a capacidade de pensamento, deixando-me assim ficar, debaixo daquele imenso deserto molhado e salgado. senti o cérebro a gelar e a regelar, senti que não passavam de pequenos choques, que apesar de fortes, sustiam todos os meus problemas e angústias. depois vim à superfície, respirei fundo, aqui estou outra vez. pronta? mais que pronta. pra tudo.
«tudo vale a pena se a alma não é pequena» , pois eu bato o pé, digo e afirmo com toda a certeza do mundo. a minha? pois essa não é pequena. que eu sou do tamanho do que vejo, e não do que querem que eu seja. sou do tamanho que preciso de ser.