Vagueios indiscretos não guardados em mim

domingo, 28 de julho de 2013

Circunstancialmente capaz.

Bebeu mais um golo da sua chávena de café. Continuou a sua longa viagem mental por lado nenhum enquanto observava paisagem nenhuma num tão belo sítio. Sorriu. A fraquíssima penugem loira que tinha agora por todo o corpo eriçou-se. Sorriu mais vincadamente. Uma ventania pequena de inspiração tinha-a arrepiado. Alimentara-se já suficiente da tristeza e depressão do mundo à sua volta descrito: nas árvores, nas flores mortas, nas peças de roupa a sombra, nos livros e nas suas histórias, na sua própria tristeza, confusão e dor. Era a sua carteira de infelicidade que sempre transportava consigo, desde que racionalizasse a sua dor. Sorriu novamente. Foi um sorriso arrogante. Sorria por ser viciada numa droga chamada tristeza. Melancolia. Talvez errasse propositadamente para sentir o prazer de encontrar felicidade junto de tudo o que lhe merecia atenção, buscando, ao mesmo tempo, tristeza e mágoa junto de tudo o que a desprezava e lhe fazia doer o peito. Sim. Estava bem agora. Bastava entrar em casa para se sentir confortável e feliz. Bastava puxar memórias que só ela guardava para se sentir desprezível, nojenta, parva. Tinha o clímax da depressão e da alegria consigo. Assim, sim. Tinha tudo reunido para voltar a viver sendo ela mesma. Para poder voltar a conviver consigo, com o passado que não queria deixar e o futuro por que tanto ansiava. O ambiente era perfeito. Pegou na caneta e abriu o caderno velho.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

as olheiras das amizades doentes, o sorriso triste das desilusões que por ela passaram. as palavras que o vento levou, as memórias que o tempo não quis deixar. os sonhos que tem e que não conta, as lágrimas e os gritos abafados na almofada. as vezes em que tem de se retirar porque o calor e o nervoso não a deixam estar quieta. as vezes que se magoou aos murros na parede. as cabeçadas na mesa. as portas que bateu. os pontapés que deu em tudo. e nada. e diz-lhe ela assim: nada te faz trazer de volta. nada te faz sentir o que eu sinto. nada te faz perceber que eu tenho um lugar na tua vida. assim como tu tens um na minha que precisa desesperadamente de ti. mas eu também tenho outra coisa. dignidade... e por aqui me fico, a bater nas teclas, a querer gritar e chorar e dormir e não acordar mais.