Vagueios indiscretos não guardados em mim

terça-feira, 6 de setembro de 2011

erica.

erica acordou. era já a sexta vez que acordava de noite. tinha muito pra dizer. suava e chorava e ria, e sorria, e olhava o infinito e as estrelas na sua imensidão. imaginava-se por lá com uma vontade de estar por cá, com coisas pra dizer aqui, mas com desejos de apenas conhecer o que se passava ali longe e desaparecer. queria berrar e estar calada. queria dizer tudo e não sabia que tudo queria nomear. queria o mundo e não queria nada. doía-lhe a cabeça, os membros, a barriga. tinha vómitos do quanto chorava, sentia até na pele o latejar do coração, tinha um nó no cérebro para além de o ter na garganta e no coração. tinha energia pra tudo mas caía fraca no chão sempre que tentava chamar por ele. sentia uma força de ódio enorme antes de sentir a tristeza que nela vivia. a confusão na sua cabeça tomou conta de tudo. não comia o pouco que lhe traziam, não conseguia sentir os cheiros, nada reconhecia, só chorava e fingia chorar quando já não havia mais lágrimas para caírem. a boca estava isenta de qualquer movimento. estava seca, e devido à dor de cabeça que a acompanhava, não respirava pelo nariz duma forma estranhamente estranha. estava magra, que nem vielas, e fria... muito fria. e a arder por dentro. não queria morrer, queria estar bem e em condições para tudo, mas não estava. por isso, a morte era a sua primeira opção. presa lá outra vez, desta podia gritar e sussurrar sem medo, ter todas as epifanias que precisasse, a sua mente louca já era desculpada naquele meio. mas o sentir-se incapaz ainda a deixava pior do que o antigo silêncio forçado. mas a incapacidade só a deixava mais lúcida. mas a lucidez não lhe dava respostas. e ela não sabia viver nela, nunca soubera. nunca fora lúcida. as pessoas lúcidas têm sentimentos profundos por várias vezes na vida. ela não tinha. e quando teve, tornou-se lúcida, real, deste mundo. e o desejo de partir para a loucura do mundo dela tomava-lhe conta da alma. daí os olhos vazios postos no céu. quando se apercebeu que nunca conseguiria sair dali chorou, de boca aberta, num certo e horrível desespero, olhava o chão, andava louca em voltas no pequeno espaço que sempre lhe fora ali cedido. sentia as lágrimas escorrerem, mas nem as sentia saírem dos seus olhos. sentia-se incapaz de tudo. e por isso chorava. a cabeça confusa, a mente vulnerável a qualquer saída.
revoltada, virava tudo num abrir e fechar de olhos, berrava agora. e sentia-se fraca. e continuava cheia de força. e queria voltar atrás mas não o desejava. queria ardentemente ficar bem, mas tencionava querer ficar no desespero em que se encontrava por ser algo que agora conhecia.
chorou. a vontade de chorar permanecia. as dores acalmaram e reduziram-se a um tal cansaço e a um batimento cardíado bem definido na sua cabeça, um latejar inconfundível, que ela sentia como nunca antes tinha sentido. estava deitada no chão, ela quente, o chão gelado.
levantou-se ao fim de algum tempo, agarrou no pouco que trazia consigo. escondeu-se atrás de uma mulher forte, a parecer uma criança sossegada, uma jovem de causas e convicções, dona da sua razão e de um certo amor, secretamente fugido. no rosto abriga marcas, más e feias rasteiras da vida. interiormente, leva a luta. a luta nem sempre fácil guardada na alma de quem se sente agora completamente sozinha. essa dura alma, que transporta também o peso de quem cedeu por uma única vez, devido ao amor que ninguém conhece estar agora longe e quase desaparecido. mas também o peso maior de quem voltou atrás e agarrou na sua razão e foi a última a bater o pé. vai por isso pesada, com um segredo que o outro vai espalhar, difamar e vender. um segredo que a vai fazer parecer barata, vendida e triste na solidão. e erica mais uma vez vai ficar mal amada no seu meio. e vai ter de voltar ao sítio onde desespera. e vai ter de fazer parte destas linhas de palavras que se reúnem a contar a história de quem vive longe demais. noutro mundo. de outra maneira. e ainda não se encontrou por ser inconstante perante as constantes situações da vida e permanece igual enquanto a vida mostra o seu lado rebelde e muda diariamente.