Vagueios indiscretos não guardados em mim

terça-feira, 25 de maio de 2010

subo o bloco. 'aos seus lugares' e soa o apito.
entro na água , ainda sem saber bem o que está a acontecer. são cem metros, quatro piscinas. há que me poupar. mas o nervosismo toma conta de mim, os meus movimentos densos são a razão para o meu cansaço. não penso em nada, mas penso em tudo. a vontade de desligar revolta-se e mostra-me imagens de tudo o que já vi, e já vivi, de tudo o que está para acontecer, de tudo o que poderia ter acontecido. um assunto leva a outro. uma imagem traz outra consigo. pensamentos rápidos, e organizados. nomes. levam a nomes. e consigo trazem muitas memórias. é rápido, mas cansa.
o meu cérebro pede oxigénio e eu vou obtendo o mais que posso a cada braçada. apesar de tudo, não sinto o corpo a falhar.
dirijo-me para a parede, a fraquejar. não me sinto cansada. não me doem as pernas, ou os braços. estou apenas sem forças para me mover na piscina, mais funda do que o habitual.
olho para cima, bem antes de fazer a última viragem. vejo uma mancha verde. toda a chamar por mim. todos aos berros. todos a acreditar. mas falho, e a última transição de direcção é fraca e demonstra cansaço.
é a última piscina, e na altura não aguentava muito, mas agora sinto que podia ter feito melhor.
quando olho, já vejo a minha adversária na parede. mas observo as bandeiras acima de mim. sei que falta pouco, muito pouco. não vejo ninguém depois da rapariga da touca preta, que já descansa junto à parede. isto dá-me pouca vontade de continuar. não há ninguém que dispute comigo o segundo ou o terceiro lugar.
rebento a parede, bem forte, com as duas mãos abertas. volto a tocar nela, mais uma vez, com medo de que a minha chegada não tenha sido contabilizada pelas placas colocadas de propósito na parede.
estou cansada, e olho à minha volta, consegui uma grande vantagem das restantes. mas não chegou para estar em primeiro. estou tonta e com necessidade de comer.
há mais uma prova, em equipa, e sei que na próxima vai ser a valer.

(...) e foi (...)

domingo, 9 de maio de 2010

revolta.

venho. sinto a minha expressão pesada. entro no carro, e nem uma palavra. ele apercebe-se, e rapidamente, leva-me à praia.
fico sozinha. tenho a música nas alturas, os fones o mais chegado a mim possível. saio do carro. tiro a vibração ao telemóvel, e começo a andar.
as nuvens cobriam tudo o que podia existir no céu, naquele fim de tarde, e ao longe, vê-se o sol passar por entre elas. o rebentar das ondas acalmava o meu espírito, os leves chuviscos molhavam-me a cara, e levavam alguma da tristeza que por mim passava.
sentei-me. encostei-me. a música continuava, e aliviava certa dor, de origem desconhecida.
não pensava em nada. subitamente, levantei-me. desci do passadiço, e fui procurar um lugar seco, no meio da areia molhada pela chuva. sentei-me em cima de uma rocha, enconstada a outra. puxei as pernas para mim. as calças dificultavam esta tarefa, mas isso não me impediu de o fazer. queria abraçar alguma coisa. alguma coisa que não falasse, que não apertasse, que não perguntasse porquê. queria estar sozinha e sem mais ninguém. só eu, e eu.
fechei os olhos, inspirei lentamente, expirei ainda mais lentamente. a música dá um forte som, e eu solto um pequeno gemido. não foi um grito, não foi um riso. parecia o início de um choro. mas não o foi. a vontade que tinha de chorar, parecia-me infinita. mas no entanto, não foi pela vontade que chorei. na verdade, não o fiz.
saí da praia. sentei-me no caminho que me levava lá. encostei-me a um banco. aí fiquei. só tinha o mar à minha frente. em cima , apenas se via as nuvens a ficarem cada vez mais escuras. dentro de mim, havia um conjunto infinito de sensações e sentimentos que me são impossíveis descrever. sei que estava bem sozinha. sentia-me revoltada com tudo e com todos. parecia que, de cada vez que me lembrava de todas as frases que alguma vez me disseram, eu encontrava algo com que contestar. apetecia-me chorar , e essa vontade ficava cada vez mais forte ao longo de todo o tempo em que ali estava. pensava em voltar para casa, ficar no meu quarto. mas aí, parecia-me ficar demasiado só. embora não estivesse ninguém à minha volta, sentia-me acompanhada. eu estava ali só, mas não me parecia. sempre que pensava na presença de alguém, pensava talvez numa invasão ao meu espaço. uma quebra de barreiras, e aí, aquele sentimento passava de pessoa em pessoa. e não o queria. por muito mau que fosse, queria guardá-lo comigo.
uma empatia com o clima foi óbvia. estava confusa, de vez em quando, sentia-me emanar um breve sorriso sem razão alguma. e foi depois de perceber isto, que o sol apareceu. mostrou-se sem vergonha e ficou ali durante breves momentos. sentia a expressão do meu rosto bem menos agressiva. sentia-me melhor. estava na altura de as nuvens voltarem a cobrir a fonte radiante que iluminava o meu pensamento.
levantei-me e fui caminhar ao longo do estrado que atravessava a praia toda. cheguei ao fim, e voltei para trás. já não estava sozinha. abrandei bastante o meu ritmo. observei com cuidado. era um homem, já de avançada idade. caminhava paralelamente a mim, mas pela areia. avançava sem cuidado nenhum. a água que caía agora do céu , afastou-o. pensei no que o levara ali, não me parecia pescador. a chuva que caía, não me levou a casa, mas sim a mais vontade de ficar ali. levemente, pus o carapuço da minha camisola, o do casaco, e continuei. como se nada fosse. quando a intensidade aumentou, não me deu vontade de correr, deu-me vontade de esperar , no sítio onde estava, até que parasse. e foi assim que fiz. nada me acelarava o passo. nem a chuva, nem o frio que sentia nas mãos. nem os cordões desapertados, nem os fones que me tinham caído dos ouvidos. simplesmente, continuava. lentamente, decidi sair dali, já nada fazia, já nada resolvia. aos poucos, aproximei-me da rua. caminhei até casa, e voltei para trás, por outro caminho. já estava sem a música ligada há algum tempo. afinal, era o que me fazia companhia. e o desejo de estar sozinha, e ouvir o ruído dos outros pequenos seres à minha volta, era importante. havia mais gente , mais vida, mais problemas, mais revolta. desconhecia outros casos, mas sinceramente, não estava com paciência para conhecer. dei voltas e mais voltas. encontrando-me sempre fora do perímetro que me permitia observar o meu prédio. encontrando-me sempre fora do perímetro que me permitia observar um local demasiado familiar.
numa rua, bastante movimentada, encontrei o silêncio e a obscuridade que tinha medo de encontrar. uma casa abandonada, velha, que apesar do tempo, mantinha as cortinas presas nas janelas já gastas. uma vida deixada para trás. em tempos viveram ali pessoas, que abandonaram tudo. podem ter simplesmente mudado de casa, ou de mundo. o sentimento de medo cresceu. ligaram-me. tinha de voltar atrás e ir buscar a minha irmã mais nova. já com ela, passei pela tal casa que me criou tanta confusão. ao pensar no que tinha sido ali deixado, agarrei-me a ela, dei-lhe a mão, e não a larguei. a sua fala rápida, e a sua excentricidade, encheram-me o coração. como nunca, até ali, tinham enchido. talvez noutro dia. num dia de alegria, ela teria percebido que me estava a irritar. olhou-me nos olhos, sorriu. e continuou a contar coisas que não me diziam minimamente nada. ao chegar a casa, largou-me. e correu para o muro. subiu-o com cuidado. ria e sorria. eu sorria também. era agora um sorriso que ambas partilhávamos. o dela, era o sorriso de uma criança, e o meu, o meu era o sorriso simples, esboçado por quem vê uma criança a sorrir.
(...)sim, porque a parte do sentimento que faltava desaparecer, apenas se foi, após uma longa noite de sonhos.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

felicidade.

acordo com o toque da minha mãe. ela coloca levemente as mãos no meu corpo, ainda quente pelo cobertor. sinto a sua pele. o cheiro do seu perfume. a sua doce voz. pergunta como dormi. diz que vai sair de casa. dá-me um beijo, faz-me uma festa. e sai do quarto. nos instantes seguintes, volta , e deseja boa sorte para o tão esperado teste de história que ia ter. estava insegura, mas só o saber que tinha agora toda a confiança da minha mãe em mim, e a sorte dela, descansou-me... agradeci, e deixei-me dormir. mais tarde, acordei com o telemóvel. tinha passado tão pouco, mas parecera-me uma eternidade. lembrei-me mais uma vez das palavras da minha mãe, tentei lembrar-me da sua imagem naquela manhã, mas apenas uma figura desfocada me veio à cabeça. o sono não me deixara abrir os olhos. deixei-me ficar deitada até conseguir ganhar forças para me levantar. já pronta para o dia que também já estava meio perdido, peguei nos livros, depois de andar às voltas em casa. estava bastante tranquila. não tanto insegura.
passou-se bem o dia, no teste, por percaução, dobrei os objectivos e coloquei-os dentro da folha de teste. não os usei. tocou, e sentia-me maravilhada por uma vez na vida, sentir-me feliz, sem que nenhum imprevisto me tenha acontecido. saí da escola, e vivi um dos momentos melhores da minha vida. jantei tranquilamente. e mal me sentei aqui, a transmitir a minha felicidade, chovem mensagens. mensagens tristes. de desespero. contando contra-tempos. contando fins de grandes histórias. contando como se sentiam.
uma das perguntas que me vai na cabeça, é se, eu neste momento, depois de saber tudo o que sei, depois de querer ajudar perdidamente tantas pessoas que me dizem muito ou pouco, sou feliz? não tanto como antes, verdade. sei que há quem esteja a sofrer impacientemente. sei que há alguém que conta comigo. alguém que se calhar até já foi rejeitado por outros 'amigos' que tiveram o célebre pensamento do 'ainda bem que não é comigo'. hoje, sei que sou feliz, e que vou transmitir isso. porque com a minha felicidade, com o valor e confiança que depositaram em mim, ao contarem tanto, eu sou capaz de os ajudar, e aliviar de tanta dor quanto me for permitido.

sinto-me feliz , porque tenho amigos. e não porque o dia me correu melhor ou pior.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

eu olho, e ela sorri. olhamos em volta, a nossa amizade pode vir a estragar muita coisa. somos cuidadosas. esta espécie de código diverte-nos, mas preocupa.
ela avança para mim no seu andar perfeito e tão típico de tão adorável rapariga.
dou um ou dois passos. e de repente, desliguei.
em tão pouco tempo, o mundo pára e sou só eu e ela. o encontro , o abraço, o nosso olhar, cada palavra, cada gesto, cada sorriso. cada jeito. é extraordinário. tudo é tão simples, mas tudo é tão complexo. como se não nos víssemos há milhões de anos, mas também , como se tivessemos acabado de nos encontrar, depois de uns breves minutos.
há tanto e tão pouco a dizer.
naquele curto espaço de tempo, onde o relógio pára de contar, e o mundo paralisa completamente. naquele tempo em que nada do que possa acontecer nos poderá algum dia separar, eu sou feliz. onde todas as divergências, todos os problemas, toda a doença, todo o mal, e até todo o bem, não fazem qualquer sentido. porque no fundo, só nós sabemos o que é aquilo.
um abraço mesmo à nossa maneira. até pode ser o mais desajeitado, o mais curto, ou o mais longo possível. o mais bonito, ou o menos perfeito. mas só nós sabemos o que sentimos. só eu sei que dentro de mim , se forma todo um novo mundo, onde, apesar de na minha consciência estar presente tudo o que nos uniu e separou, e tudo o que chateou ou divertiu, eu vou sempre gostar de ti. na saúde, na doença, ou no que todos os outros quiserem.
porque nada nos vai separar mais do que nós quisermos. ou unir mais do que nós precisarmos.

sábado, 1 de maio de 2010

a minha infância foi rodeada por gente feliz. éramos crianças felizes, e não sabíamos o que nos esperava. agora todos temos a certeza do que tal mistério seria: vivermos todos juntos, diáriamente. desde cedo que me senti bem à vossa beira. sempre me senti confortável ao ver sempre as mesmas caras, ao sentir sempre o mesmo ritmo, sempre as mesmas vozes, sempre as mesmas reacções. era sempre o mesmo. tornou-se uma rotina. tornou-se a minha vida.
a minha noção de amigo, ficou, de certa forma, ligeiramente afectada. para mim, a verdadeira essência de amigo, era o estar sempre com ele. amigo, era aquele que passou a maior parte da vida connosco. que esteve connosco todos os dias. mesmo que passasse por nós, completamente indiferente. eu estava ali. ele também. era meu amigo. nem que não lhe falasse das coisas que me incomodavam. nem que não lhe falasse do que me agradava. era amigo, e acabou.

era ainda criança, e era assim que via as coisas.

nova etapa da minha vida. para além dos já habituais "amigos" apareceram outros. ficámos sempre todos juntos. fisicamente. mentalmente começávamos a dispersar. nessa altura nem tínhamos a noção de nada. apareceram novas pessoas, e a nossa cumplicidade afastou-as de início. não nos parecia bem. gente desconhecida. mas foi essa mesma cumplicidade que nos fez abrir caminho para os novos "amigos". criámos uma nova teia. capaz de expulsar todos os que nos enfrentavam. o pior, é que afastávamos também quem tinha boas intenções.
mais tarde, cada um começou a pensar pela sua cabeça. cada um tinha a sua opinião. apesar de todos juntos, criámos caminhos em diferentes direcções. foi assim que admitimos pessoas novas nas nossas vidas. foi assim que percebmos quem realmente éramos. e foi assim que percebemos quem , do nosso meio, era verdadeiramente amigo.
eu nao esqueci de onde vim, com quem estive, e com quem estou, de quem fui, ou de quem sou, mas muito mudou, desde o dia em que tudo começou.
basicamente, amigos mesmo eram aqueles que estavam ali desde sempre. e isso estava errado.
completamente errado.
com o tempo, abri os olhos, e com o tempo fiquei cada vez mais orgulhosa por poder dizer que reconheci verdadeiramente os meus AMIGOS!
uns mais, outros menos, mas todos sabemos, que, a qualquer dia, em qualquer hora, poderemos formar mais uma vez uma barreira, protegermo-nos uns aos outros, se caso for preciso.
apesar de todas as discussões alguma vez feitas. apesar de tudo o que sabemos. de todos os defeitos que conhecemos uns nos outros, nunca nos vamos esquecer de tudo o que já nos uniu. e que , felizmente, continua a unir!

eu não me arrependo dos doze, dos dez, oito ou dois anos que passei convosco!