Vagueios indiscretos não guardados em mim

terça-feira, 24 de julho de 2012

(re)encontro

apetecia-me ser pequenina, chamar amigos a todos, ter um verão pré-programado pelos pais: casa dos avós, a brincar com os primos e a comer bolinhos de bacalhau e rissóis antes do almoço, e arroz de frango as vezes que me apetecesse. apetecia-me ver os desenhos animados de manhã, não me preocupar com as horas ou os dias a passar, não ter de apanhar este ou aquele autocarro porque tenho de fazer isto e aquilo. é chato estar nesta idade. ficar em casa fechado é crime, tanto para mim, como para os meus pais, como para a estúpida e inexistente reputação social, quem é o ser que não vai à praia no verão, ou ao shopping, ou mesmo aos jantares que teimam em marcar? então, se é crime, vamos sair. vamos sair... e entrar no autocarro. que só me leva até ali. dali para não sei onde a pé e depois, quiçá, não apanho o metro para acolá. cansa ser dependente e independente. estar ali no meio. ter chave de casa mas não sair e chegar quando quero. ter dinheiro e não ser meu. ser grande, mas pequena. tomar decisões, mas não escolher. ver o mundo, quando ele não me vê. credo... olhando agora para isto, não sei se algum dia, alguma idade será ideal. ou a mais, ou a menos. ou nem uma coisa nem outra. ter de pensar no futuro e não o poder escolher... é quase como tentar mexer no passado... mas ser criança não é só dormir na sala dos avós com os primos, não é só em relação à idade, não é só em relação ao pequeno almoço que a avó nos leva quando descobre que estamos acordados há quase tanto tempo como ela a ver bonecos na caixinha magica. disseram-me hoje que eu encontrei a minha criança interior. existem mais nomes para este estado de espírito, mas a este, achei uma piada particular... tenho dado por mim a amar o mundo. a querer abraçar cada flor, a sorrir para cada árvore, a admirar cada pedaço de plástico, cada cor, cada brilho. a sentir um afeto enorme por animais que sempre me causaram algum desconforto, a adorar cada pedaço de comida, cada sabor, cada evolução- natural ou criada pelo homem. tenho-me encontrado apaixonadíssima por cada passo que dou, por cada ser vivo, por cada objeto. tenho-me encontrado. e a verdade é que nunca em criança senti isto, daí não perceber a expressão "criança interior". será que os adultos não sentem isto? tenho medo de não sentir-me assim, nesta sintonia com o mundo, nesta paz libertadora para sempre... ser adolescente, pelos vistos, passa por andar no meio. por ter um quarto e fazer a nossa própria comida, mas não ter uma casa. e deslocar-me sem ter carro. e beber café mas sem licença (do médico), ou dar-me com as pessoas, dar-me a elas, mas olhar para trás e ver que não sei que amigos tenho aqui. passa por ter de lidar com o físico, fruto da educação ociental, mas admirar o lado natura, o lado espiritual das coisas que vem dum crescimento interior muito mais oriental. ser adolescente aqui é estar entre o oriente e o ocidente e não poder escolher. é andar de autocarro, ficar sem bateria no telemóvel, ouvir sermões, amar os pais, beber café e coca cola à noite. é comer uma francesinha inteira, pedir um menú grande, cozinhar, arrumar e desarrumar. é ter amigos que os pais não conhecem. ser adolescente é ir. não é partir, não é chegar. é ir. é o caminho. é crescer.

para ti, que ainda és pequena e que recentemente te consideraste adolescente: espero que aqui chegues tão bem como eu. sim, aqui. porque podes nao ser criança, podes não ser adulta, mas ainda não andas de autocarro sozinha, não arrumas, não cozinhas, mas acima de tudo, ainda tens muita paz para encontrar em cada pétala, cada borboleta, e muito para admirar em cada personalidade, em cada pessoa, em cada ser vivo e em cada umas das suas funções. boa viagem