Vagueios indiscretos não guardados em mim

domingo, 28 de julho de 2013

Circunstancialmente capaz.

Bebeu mais um golo da sua chávena de café. Continuou a sua longa viagem mental por lado nenhum enquanto observava paisagem nenhuma num tão belo sítio. Sorriu. A fraquíssima penugem loira que tinha agora por todo o corpo eriçou-se. Sorriu mais vincadamente. Uma ventania pequena de inspiração tinha-a arrepiado. Alimentara-se já suficiente da tristeza e depressão do mundo à sua volta descrito: nas árvores, nas flores mortas, nas peças de roupa a sombra, nos livros e nas suas histórias, na sua própria tristeza, confusão e dor. Era a sua carteira de infelicidade que sempre transportava consigo, desde que racionalizasse a sua dor. Sorriu novamente. Foi um sorriso arrogante. Sorria por ser viciada numa droga chamada tristeza. Melancolia. Talvez errasse propositadamente para sentir o prazer de encontrar felicidade junto de tudo o que lhe merecia atenção, buscando, ao mesmo tempo, tristeza e mágoa junto de tudo o que a desprezava e lhe fazia doer o peito. Sim. Estava bem agora. Bastava entrar em casa para se sentir confortável e feliz. Bastava puxar memórias que só ela guardava para se sentir desprezível, nojenta, parva. Tinha o clímax da depressão e da alegria consigo. Assim, sim. Tinha tudo reunido para voltar a viver sendo ela mesma. Para poder voltar a conviver consigo, com o passado que não queria deixar e o futuro por que tanto ansiava. O ambiente era perfeito. Pegou na caneta e abriu o caderno velho.

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